O clima, que está garantindo uma produção farta de café no país nesta safra 2020/21, cuja colheita está na reta final, deverá ser motivo de dor de cabeça no próximo ciclo. A falta de chuvas e mais uma semana que começou quente, com temperaturas na casa dos 40°C na região Sudeste do País, poderão ter reflexos negativos na temporada 2021/22.
O ciclo será de bienalidade negativa, o que já pressupõe uma produção inferior. Ocorre que a falta de chuvas em volume elevado impede que ocorram floradas uniformes. “Nunca na minha vida tinha visto uma colheita em que não choveu nenhuma vez”, disse José Marcos Magalhães, presidente da Cooperativa dos Cafeicultores da Zona de Varginha (Minasul), ao Valor.
Pegamento
Segundo ele, na área de atuação da cooperativa já há relatos de floradas pontuais, mas não há umidade suficiente no solo para o “pegamento”, percentual de flores que darão lugar aos frutos. “Nas plantas mais novas, o prejuízo já está concretizado”, afirmou Magalhães.
“Se uma florada vier nesse cenário, a taxa de ‘pegamento’ será muito pequena. A situação é preocupante”, reforçou Celso Vegro, pesquisador do Instituto de Economia Agrícola (IEA) da Secretaria da Agricultura de São Paulo.
Segundo ele, a taxa normal está em torno de 50% de “pegamento”, mas nessas condições a expectativa é de aproximadamente 30%. “Isso não impede que ocorra uma florada mais pra frente e a situação se recupere, mas a safra não terá a uniformidade que vimos no ciclo passado”, disse.
Negociações
A preocupação com a produção chegou a tal ponto que a Minasul passou a recomendar cautela nos contratos de “barter” (troca de insumos por café) e na venda antecipada da colheita da safra 2021/22, para reduzir o risco de o produtor não conseguir cumprir suas obrigações. Em 2020/21, o volume vendido antecipadamente foi recorde.
“Por conta da expectativa de a colheita em 2021 já ser baixa por causa de bienalidade negativa, não seria uma surpresa ver poucas negociações em barter. Ainda assim, não podemos caracterizar essa tendência como atípica”, afirmou Matthias Koenig, diretor de Negócios da Nutrade, da Syngenta.
Para Celso Vegro, os negócios estão contidos também em razão das incertezas geradas pelas eleições americanas e, por consequência, do impacto que o pleito terá no câmbio. “Enquanto a eleição presidencial americana não acabar, nada vai se mexer”, disse.
Preços
Se a safra nova preocupa do ponto de vista produtivo, tende a ser positiva no que tange aos preços. “Temos pouco café no mercado disponível, e o clima como está até hoje talvez possa oferecer suporte às cotações no mercado internacional”, afirmou Carlos Augusto de Melo, presidente da Cooperativa Regional de Cafeicultores em Guaxupé (Cooxupé).
Segundo Gil Barabach, consultor da Safras & Mercado, as recentes quedas de preços na bolsa de Nova York refletem a chegada de chuvas apenas pontuais na virada de agosto para setembro. “Mas a questão da florada ainda não está precificada. Estamos em transição. Se a florada que está por vir decepcionar, vai se refletir nas cotações”.
Segundo o diretor comercial da Cooperativa de Cafeicultores e Agropecuaristas (Cocapec), Saulo Faleiros, a eventual consolidação de uma segunda onda da pandemia também preocupa.
(CNC)